sábado, 2 de dezembro de 2023

Acredita Francisca Running

 A vida dá muitas voltas e nós crescemos a cada volta que ela dá! 

É sobre ACREDITAR que aqui vos falo hoje. Que, de facto , é aquilo que rege a minha/ nossa vida, pois se acreditarmos efectivamente conseguimos. E às vezes não acreditando, basta haver uma pessoa que acredite por nós e nos leve a acreditar também!!

Assim tem sido na vida , como na corrida. 

Eu correr 5km? Se me dissessem isso há 2 anos e meio atrás eu ia rir-me muito. Fazer 27km em trail? Era a piada do momento!! Acordar às 5h40 para ir treinar? Pronto, aí já quem inventasse essa estaria em delírio grave! 

Pois é, mas tudo isto se tornou verdade, e não se trata só de correr, trata-se de alegria, bem estar, superação e terapia. 

E desenvolvimento pessoal. 

Tem sido um percurso bonito, de aprendizagem constante , onde tive muitas pessoas que me ajudaram e a quem estarei sempre grata .

Amanhã corro pela primeira vez com uma camisola que me diz muito, no dia internacional da deficiência. 

Conto somar muitas corridas com ela. 

Não é uma equipa de atletismo, é um grupo de literal amor à camisola! 

A ti Miguel, obrigada é muito pouco por tudo e por tanto! Só nós sabemos o amor que nos une ❤️

Aos meus sogros, pais, cunhados/as,  são vocês que tornam possível! 

Às minhas amigas e irmã que acham que eu sou a Rosa Mota, #sqn , obriga pelo boost de motivação e auto estima que às vezes preciso para continuar mesmo sabendo perfeitamente que estão enganadas! 

À equipa Fisioactive Team, obrigada pelo crescimento , aprendizagens e oportunidades! Foi um percurso bonito e enriquecedor. 

À Rita e ao Pedro, posso esquecer quem me magoa, mas nunca quem me levanta! 


A minha camisola não tem clube, pelo que qualquer pessoa pode, se quiser,  algum dia,  correr com ela, desde que seja com amor ❤️





terça-feira, 12 de abril de 2022

Escola - A perpetuação da desigualdade de oportunidades

 



A escola não é inclusiva. E não o será enquanto houver segregação. Tem leis que mascaram de inclusivo um sistema que não olha com bons olhos para as crianças com dificuldades ou necessidades especiais e que as segregam em turmas por categorias de bons e maus alunos. Isto acontece em todas as escolas. Os bons alunos são concentrados todos nas mesma turma, formando-se assim turmas de excelência onde ensinar motiva o professor e tudo conspira a favor do sucesso escolar. Os maus alunos, por questões comportamentais ou por dificuldades de aprendizagem ficam todos segregados na mesma turma. Ensinar é frustrante, aprender não tem graça. Comportamento gera comportamento. Aos olhos dos professores estes alunos são todos iguais, não querem aprender, são mal educados, imaturos e “não vão longe” nas aprendizagens e no percurso escolar. A perspetiva é de que ali, não dá para mais. O ambiente de desinteresse, desordem e desistência cria-se facilmente e não há equilíbrio.

As crianças das turmas de excelência interiorizam que são “os bons”, superiores, de outro nível, e assim são ensinadas a olhar para si. As “outras crianças” perpetuam as dificuldades, os comportamentos menos adequados e assim se mantêm em desvantagem e se perpetua uma sociedade desigual, cuja formação ocorre desde a infância.


Sou da opinião de que não teremos de ser todos “doutores”, nem é disso que se trata aqui. O que acredito é que a crianças com dificuldades não deixaria de as ter só por integrar uma turma mais equilibrada, mas talvez ajudasse na sua concentração, motivação e consequente maior sucesso. A criança com comportamento desafiante talvez não deixasse de o ter, mas talvez se fosse equilibrando um pouco mais e assim aprendendo a saber estar de forma mais adequada dentro do contexto escolar e consequentemente nas outras vertentes da sua vida.

Não posso assim concordar que a escola seja inclusiva, e embora às vezes até consigamos encontrar alguma vontade em melhorar, não há recursos humanos e físicos.

A escola é a perpetuação de uma sociedade desigual. Há, como em todos os casos, exceções. Mas não são regra. Falo por experiência própria. E não deveria ser preciso sorte para se encontrar um bom professor.

 

segunda-feira, 31 de maio de 2021

Diagnóstico não dita o futuro!


 



Já há muito que não escrevia aqui, hoje senti necessidade. 

Senti necessidade porque este cantinho que é a página Acredita Francisca além de ser um espaço de partilha do nosso dia a dia e desmistificação do que a trissomia 21, é também o sítio onde partilho as nossas conquistas mas também as frustrações. E não faz sentido pintar tudo de cor de rosa porque sabemos que a vida real não é assim. 

É por isso que hoje partilho convosco que às vezes não sei se sou eu que coloco expectativas muito elevadas quanto às potencialidades e ao futuro da Francisca ou se realmente a sociedade ainda tem muito que evoluir. E se esta evolução ainda não aconteceu nos profissionais de saúde que lidam diretamente com crianças/pessoas com necessidades especiais, sejam elas quais forem,  então estamos muito longe do que é realmente uma sociedade inclusiva. 

Hoje, na  segunda consulta de psicologia de desenvolvimento, sendo que a primeira foi há dois anos atrás, a psicóloga começou por querer fazer um apanhado da situação atual da Francisca. 

Fui de coração aberto, como sempre, e referi então as especialidades médicas pelas quais a Francisca é acompanhada e qual a intervenção atual no âmbito da estimulação cognitiva.

 Na conversa referi ainda o que já vos contei aqui, que foi no íncio da pandemia há um ano atrás, com algum choro e ainda alguma dor à mistura, que acabei por aceitar e encarar de frente as dificuldades da Francisca, sabendo que elas iriam fazer parte do seu  percurso, a par das conquistas, tal como acontece com qualquer criança, qualquer pessoa. 

O assunto seguinte foi a entrada na escola em setembro e foi aí que eu deixei de falar. Foi me dito que eu iria chorar ainda muitas vezes, porque o sistema de ensino não está preparado ainda para ser verdadeiramente inclusivo e que eu iria ter de estar muito atenta. Concordo. 

De seguida foi me dito que o importante é que ela aprendesse o essencial, a ler e a escrever porque depois tinha de ser o mais autónoma possível para integrar um emprego protegido. Que haveriam conteúdos que, portanto, não iam ter interesse nenhum para ela.

Eu ainda tentei explicar que ela não tinha de aprender o mínimo mas sim tudo quanto lhe for dado e ela for capaz de apreender, como qualquer outra criança. Disse-me que sim, mas que o mais importante era que ela tivesse acompanhamento nos intervalos, que era aí que ela ia ser feliz por isso convinha ter alguém a vigiar e a garantir essa felicidade. Até porque da sala de aula, ela não ia gostar. De referir que esta profissional não fez nenhuma avaliação à Francisca na consulta e a única pessoa que falou fui eu. 

A questão aqui não é o que a Francisca vai ou não fazer no futuro, porque isso ninguém sabe e seja qual for o seu futuro das minhas filha, eu só quero que seja digno. A questão aqui é ditar o futuro de uma criança pelo diagnóstico que tem. Aprender o mínimo, ser feliz e ter um emprego protegido para ganhar algum.  E porquê? Porque tem Síndrome de Down. Não aceito, nem nunca vou aceitar. 

A escola dá bagagem e é fundamental. As aprendizagens não podem ser as mínimas. E a bagagem que a escola dá, a par da educação familiar, é a preparação para a vida, a capacidade de critica, a capacidade para gerir um conjunto de situações do dia a dia, a capacidade para estar integrado, a capacidade para ser capaz (desculpem a redundância) para viver em pleno exercício de direitos e deveres. 

Não falo portanto de canudos, de status, falo sim do direito que a minha filha tem, e por esse sim lutarei, de ter as mesmas oportunidades de aprendizagem e de vida que qualquer outra criança. 

Se já começa assim não me verão as lágrimas mas sim as garras. 




quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

Ah e tal o confinamento...










É um caos. 


E em casa com elas todo o dia? 

É de fugir!


E a escola online?

Serve para eu aprender umas coisinhas!


E quando a Francisca pede 20 vezes para ver o Lucas Neto?

Cedo 10. 


E aquele material que a prof. de EV pede e tu além de não teres em casa não há nada aberto onde comprar?

Não  há-de reprovar por isso. 


E aquele berro que os vizinhos te ouviram a dar às miúdas?

A colega da CPCJ ainda não me ligou...


E como te sentes no fim do dia?

Sem energia. Deitamo-nos juntas e abraço-as, com o coração a transbordar de amor! 












terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

Afinal, curar o quê?












Foi em março de 2020, aquando do confinamento, que comecei a perceber algumas dificuldades da Francisca e comecei a perceber que havia algo mais a trabalhar. Tudo o que fiz para trás não duvido que foi bem feito mas senti que ela precisava de uma intervenção diferente. 
Hoje sinto que mudei no momento certo, atualmente está com apoio de psicomotricista, terapia da fala, terapia ocupacional, fisioterapia e infantário. E embora isto ainda possa parecer muito aos olhos de uma mãe "típica",para mim é o cenário perfeito. Retirou de mim o peso que decidi carregar por 5 anos de ser responsável única pelo desenvolvimento da minha filha (mais uma vez, sem qualquer arrependimento).

Nestes últimos seis anos foi acontecendo de forma gradual algo crucial: a plena aceitação de que a minha filha tem uma condição genética que lhe trouxe dificuldades cognitivas e que a ilusão da "cura" é utópica. E afinal curar o quê? Ela não é doente, não é limitada (quem é que definiu os limites?) é como é e é desta forma que eu, a família e a sociedade a devemos aceitar. 
Consegui neste últimos 6 anos a evidência de que as crianças com dificuldades cognitivas ou com alguma deficiência são capazes de tudo, precisam de um pouco mais de investimento, um pouco mais de tempo e um pouco mais de paciência. 
Aprendi que a frustração é um problema meu e que nunca poderei deixar que seja o dela. 

Cada mãe/pai deve, com equilíbrio, encontrar o seu caminho. Eu encontrei o meu. 

Passados 6 anos... sempre estive feliz, mas nunca tão tranquila! 

domingo, 7 de fevereiro de 2021

Os dias, os anos...que se seguiram








7 dias para os 6 anos!



No dia 15 tivemos alta. Pedi muito para ir para casa.

Era domingo, não haviam as vacinas que normalmente os bebés tomas após o nascimento e portanto ficamos com o compromisso de que voltaríamos no dia seguinte para ela as tomar. 

Informamos a família de que íamos voltar. Uma das minhas cunhadas, que estava a par de tudo, tinha preparado na minha casa o nosso regresso e a família esperava-nos. Não sabiam de nada. 

No caminho liguei para a pediatra que já acompanhava a Matilde e em quem confiava plenamente. Pedi-lhe por favor que visse a Francisca naquele dia, que a pudesse observar e que com o seu olho clínico pudesse dar o seu parecer. Estava marcado para as 18h. Tinha de "despachar" a família até lá porque se dissesse que a ía levar a uma consulta ia causar alarido. 

Todos nos receberam felizes e com carinho, sem imaginar o sufoco que vivíamos por dentro. 

Às 17h30 saímos de casa na esperança de que a Dra C. nos ajudasse, e ajudou muito. Disse-nos que pela sua avaliação poderia haver trissomia ou hipotiroidismo congênito, para aguardarmos com calma e que quer numa situação ou outra iria correr bem porque, nomeadamente no caso da trissomia, só conhecia histórias felizes. Deu-nos a conhecer alguns blogs, aconselhou a contar à família apenas quando houvessem certezas e disponibilizou-se para qualquer ajuda. Detetou ainda um sopro no coração que não lhe pareceu nada significativo e que iria acompanhar. 

Regressamos, e a meio do caminho recebemos uma chamada da irmã mais velha do Miguel, que nos foi visitar mas nós não estávamos em casa. Dissemos que fomos sair e ela achou que estávamos loucos! 

Nesse dia à noite notei que a Francisca ficava cianosada na zona da boca em alguns momentos e por conselho de uma amiga no dia seguinte, quando a Francisca foi tomar as vacinas, partilhamos esta situação com a pediatra que nos aconselhou a ir à urgência. Como já referi noutras publicações, a Francisca ficou internada para observação devido a um problema cardíaco e foi durante esse internamento, ao 6º dia de vida, que tivemos a confirmação: Trissomia 21 por mosaico. 

O Miguel ainda alimentava em si a possibilidade de ela não ter nada e custou-lhe mais; eu já quase não tinha dúvidas, já tinha lido muito, já tinha procurado terapias, falado com uma amiga que trabalha na área da deficiência e que me tinha acalmado o coração, portanto para mim já não foi um choque. 


Passados 6 dias tivemos alta e eu saí com força. Na verdade o que me movia era a vontade de combater a trissomia, quase uma ilusão (muito errada) de cura. Estava disposta a fazer de tudo para que ela não tivesse nenhum handicap. Li muito, conversei muito com outra mãe, muitas pessoas se disponibilizaram para me ajudar e eu estava convicta de que ia correr bem. 

Há muito quem fale de um processo de luto do bebé idealizado nos 9 meses de gestação e que após um diagnóstico como este é inevitável que se reformule sonhos e perspectivas para aquele "novo" filho. Eu passei algumas fases do luto, nomeadamente as questões do "porquê eu", o choro, a revolta, o desfazer-me de todas as roupas de grávida, mesmo as que podia continuar a usar e das quais gostava, Durou pouco tempo este processo mas sem vergonha assumo que passei por ele...

Aos dois meses e meio fomos com ela a Madrid, fazer formação do método Doman para pais e a avaliação para que pudéssemos logo começar a implementar a estimulação precoce intensiva que duraria até aos 6 anos de idade. 4 dias intensos, de muita aprendizagem e de muita esperança no coração. 

Seguiram-se 5 anos de terapias, preparação de material ao fim de semana, aplicação de exercícios diários feitos por mim e por todo um conjunto de pessoas que acima de tudo souberam respeitar as minhas decisões e alinharam comigo em prol do desenvolvimento da Francisca! Foram milhares de horas de investimento que estou convicta de que valeram a pena. 



                                                                                                                  

                        

                                                            



                                                            


                                                        



                                                        


                                                        




Muitas conquistas, muitas frustrações e uma obsessão diária em não falhar com nada. 

Nesses 5 anos mudamos de casa, mudamos de terapeutas, aprendemos a ser humildes e a pedir quando precisamos de ajuda, criamos este pequenino blog, ajudamos outros pais, outros pais nos ajudaram. Os amigos de verdade ficaram connosco, conhecemos novos,  perdemos alguns que não entenderam as nossas escolhas e não souberam lidar com as nossas decisões, fomos apreciados e criticados...  Entre sentimentos de culpa por achar que poderia fazer mais, vontade de desistir de tudo, ataques de pânico... entre ajudas preciosas e desajudas que mais tarde percebi que foram o melhor, chegamos a 16 de março de 2020 convictos de que tudo estava certo e era suficiente porque já nos parecia tanto...



                                          




                                           


quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Era minha, eu amava-a, tivesse ou não trissomia 21

 





Daqui a 9 dias, 6 anos. 

Devem estar a perguntar-se porque estou a relembrar todas estas memórias. Os seis anos são especiais para nós, logo irão perceber porquê. 


Dia 14 de fevereiro de 2015. Dia dos namorados!

Acordamos, o Miguel chegou e pouco depois começou a ronda dos pediatras. Veio primeiro uma interna, observou, auscultou, observou, auscultou... saiu. Volta passado instantes com mais duas pediatras e observaram-na novamente dos pés à cabeça. 

A dada altura comecei a não achar normal e perguntei se estava tudo bem. A resposta veio a seguir, da forma pouco humana que já sabem. Havia suspeita de trissomia 21 e só com análises teríamos certezas, podendo ter de esperar mais de duas semanas. 

 O meu coração parou, o mundo desabou, as lágrimas não paravam de escorrer pelo rosto. As perguntas vieram... "Como é que é possível?" "Porquê nós?". Lembro-me de pensar que não merecíamos o que nos estava a acontecer, mas a dor que sentia não era por mim, era por ela! Todos os pais desejam que os filhos sejam saudáveis e que possam ter uma vida feliz, sem dificuldades significativas. Atrevo-me a dizer que todos os casais que pretendem ter filhos perspectivam uma vida tranquila, mágica, no mínimo uma vida que corre num percurso "normal". 

As pediatras saíram 2 minutos após terem-nos dado a suspeita da trissomia e logo de seguida vem a enfermeira ensinar-nos a dar banho. Mas alguém julgava que eu estava capaz de ouvir o que quer que fosse que ela tivesse para me ensinar? Tive que lhe dizer que não conseguia. 

Ao mesmo tempo que chorava, abraçava e prometia à Francisca que ia cuidar o melhor possível dela, e que ia fazer os possíveis e impossíveis para ela ser capaz de tudo aquilo que ela quisesse...  Lembro-me de querer tanto sair dali, estar no meu canto, abraçar o Miguel, conversar do que quisesse sem ter outras pessoas que nem conhecia a ouvir.... 

Não contamos aos nossos pais e a quase ninguém, queríamos ter certezas para evitar que se preocupassem. Contamos a uma irmã do Miguel, à minha irmã e a uma das minhas melhores amigas. Queríamos ter certezas para evitar que se preocupassem. Foram o nosso apoio nos três dias que se seguiram, ouviram e sentiram a nossa angústia, choraram connosco.

A noite chegou, estava cansada, adormeci cedo. Passado um pouco a Enf. C., que assistiu ao parto , um anjo, veio conversar comigo, dar-me alento, contar-me exemplos que me encorajaram e dar-me um abraço. São atitudes que nunca se esquecem e que não têm preço! 

Voltei a adormecer e a resposta para a minha pergunta do "porquê eu" começava a surgir, foi porque Deus e ela nos escolheram e ambos achavam que íamos estar à altura!